Análise da série The Leftovers (3ª temporada)

Atenção! O texto a seguir contém spoilers da segunda temporada de The Leftovers.

Em suas duas primeiras temporadas, The Leftovers nos apresentou uma série de eventos misteriosos. Tudo começou com o dia da partida repentina, passando pelo culto dos Remanescentes Culpados e a imortalidade do personagem Kevin (Justin Theroux). Três anos após os eventos finais da segunda temporada, o mundo agora se aproxima do sétimo aniversário do dia em que 2% da população mundial desapareceu. Se 14 de outubro de 2011 foi realmente a data do arrebatamento, faltavam pouquíssimos dias para o apocalipse. O fim do mundo também é abordado no prólogo da temporada e é com esse clima que Damon Lindelof e Tom Perrota começam a narrativa de conclusão da atração.

O terceiro ano inicia retratando a vida dos personagens em Jarden e explicando o que aconteceu com os Remanescentes Culpados que invadiram o local. Kevin agora é o chefe de polícia da cidade, Tom (Chris Zylka) tornou-se policial e Nora Durst (Carrie Coon) retomou seu emprego no DSD, o órgão do governo que paga benefícios para as pessoas que perderam seus entes no dia da partida repentina. Laurie (Amy Brenneman) e John Murphy (Kevin Carroll) se casaram (por essa ninguém esperava) e trabalham juntos enganando as pessoas que visitam a região. Já Jill (Margaret Qualley) e Erika (Regina King) se mudaram da cidade, enquanto Matt (Christopher Eccleston), com a ajuda de Michael (Jovan Adepo) e John, começou a escrever um evangelho sobre a vida de Kevin. O próprio Kevin parece não aceitar a sua condição, já que mais de uma vez ele tenta se sufocar com um saco plástico. É curioso observar como a fé de Matt em Kevin é responsável por afastá-lo das maiores graças que ele recebeu nos últimos tempos, a recuperação de sua mulher e o nascimento de seu filho.

A trama começa a mudar de rumo quando Nora é contatada, via telefone, pelo ator Mark Linn-Baker, que afirma conhecer pessoas que podem fazer com que ela se reencontre com os seus filhos. Esse acaba sendo o pontapé inicial que desencadeia a viagem de Nora e Kevin até a Austrália, onde o pai de Kevin já está há algum tempo. Quando Matt descobre que Kevin está do outro lado do mundo, ele elabora um plano para trazer o policial de volta a Jarden antes do dia 14 de outubro, o que, segundo suas crenças pessoais, impediria o apocalipse. Junto com John, Michael e Laurie, Matt vai para Melbourne, que passa a ser um dos cenários principais da temporada de despedida de The Leftovers. Diferente da missão espiritual daqueles que estão escrevendo o livro sobre Kevin, Laurie tem o propósito de tentar ajudar o ex-marido a lidar com seus problemas mentais.

A partir do segundo capítulo, a série começa a adotar uma nova postura, dedicando episódios inteiros a personagens específicos. The Leftovers na verdade já tinha feito isso nas temporadas anteriores, mas não repetiu tanto a fórmula como vemos no terceiro ano. “Don’t Be Ridiculous” é centrado em Nora e no propósito que a levou a até a Austrália; “Crazy Whitefella Thinking” conta a maluca e divertida história de Kevin Garvey Sr. (Scott Glenn) em aprender músicas de tribos indígenas australianas para tentar evitar uma grande enchente; “It’s a Matt, Matt, Matt, Matt World” mostra todo o esforço desempenhado por Matt em provar para os outros suas convicções, bem como colocar em prática seus últimos planos; e “Certified” apresenta as angústias vivenciadas por Laurie desde a partida repentina, o que nos leva a concluir que sua entrada nos Remanescentes Culpados foi uma tentativa de encontrar um sentido para sua vida, o que acabou não se concretizando, conforme vimos na temporada passada. A forma com que esses episódios foram construídos funcionou muito bem, já que eles deram maior profundidade aos personagens sem perder o contexto da história principal. Por outro lado, Jill e Tom possuem pouquíssimos tempos de tela, mas isso não afeta a condução do enredo.

Se por acaso você achava estranho as visitas de Kevin no famoso hotel quando ele morria, se prepare para o penúltimo episódio. Em “The Most Powerful Man in the World (and His Identical Twin Brother)”, os roteiristas nos brindam com a situação mais insana já vista no mundo da série. É também nesse episódio que descobrimos o que aconteceu após o sétimo aniversário do dia 14 de outubro de 2011, temática recorrente na temporada. Por fim, o capítulo final encerra a história de The Leftovers de uma forma poética e bonita, cabendo a você decidir se acredita ou não na explicação que é dada por Nora nos minutos finais, durante a sua conversa com Kevin. Seja qual for a sua interpretação, fato é que a personagem finalmente conseguiu encontrar a paz que tanto almejava.

Ao terminar The Leftovers confesso que fiquei aliviado. Até o penúltimo episódio, estava extremamente receoso que a atração da HBO não conseguisse apresentar uma conclusão coerente para a sua história. Ao longo das três temporadas, o telespectador pôde perceber que a partida repentina, apesar de ser um tema recorrente na série, nunca foi o seu mote principal: o ponto crucial sempre foi as consequências que o desaparecimento de 2% da população mundial causou na vida das pessoas. Assim como aconteceu em Lost, por mais que haja muitos mistérios, a trama é totalmente focada na jornada de seus personagens, o evento sobrenatural foi um mero pretexto para o desenvolvimento do enredo. A diferença está na forma com que o final é conduzido: após toda a polêmica em torno do desfecho de Lost, Damon Lindelof desta vez não optou por apresentar uma conclusão, digamos que simplória, para sua obra. O encerramento escolhido condiz perfeitamente com toda a complexidade que foi retratada por The Leftovers no decorrer dos seus três anos.

Considerações finais
Desta vez um pouco menor, com apenas oito episódios, a temporada final de The Leftovers apresenta uma sucessão de eventos que caminham juntos para um ponto comum. Pequenos detalhes, como o salto temporal de três anos, mais episódios dedicados a personagens específicos e uma trilha sonora diferente em cada abertura (com exceção do primeiro episódio, que não possui créditos iniciais) indicavam que as coisas estavam diferentes. Por outro lado, quando os temas musicais da primeira e segunda temporada são utilizados nas aberturas dos episódios sete e oito, respectivamente, a atração estava retomando as situações que surgiram nos anos anteriores para finalmente concluí-las (vide o desfecho dos dois últimos episódios).

Além da história, o que mais me cativou em The Leftovers foi o excelente trabalho desempenhado por seus atores, que demonstram com maestria o drama vivido por seus personagens. Os destaques ficam com Justin Theroux e Carrie Coon, que retratam os protagonistas da atração. Não menos importante, a parte técnica mais uma vez não decepciona e entrega ao público cenas que favorecem o tom dramático e misterioso do seriado. A trilha sonora segue o alto padrão dos anos anteriores e os simbolismos mais uma vez estão presentes por todo o lado, indo do prólogo até simples diálogos (ou silêncios) no curso da trama. Essa é uma daquelas séries que merecia um maior reconhecimento do público. Fica aqui a minha recomendação!

Nota
★★★★★ – 5 – Excelente

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Criador e editor do Portal E7, Herbert é advogado, amante de games e séries. Gamertag/ID: "HerbertVFV".
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