Análise do jogo Assassin’s Creed Shadows

Quando falamos da franquia Assassin’s Creed, um dos pedidos feitos há anos pela comunidade era um jogo ambientado no Japão feudal. Depois de explorar diversas localidades em épocas distintas da sociedade, a Ubisoft finalmente resolveu nos levar até a Terra do Sol Nascente com Assassin’s Creed Shadows. Seguindo a pegada RPG já vista em outros games da série, acompanhamos uma história repleta de conspirações, vingança e traição, onde os personagens são capazes de fazer qualquer coisa por poder, por menor que ele seja.
A trama começa nos levando até o ano de 1581, nos apresentando Diogo, um forasteiro negro que foi resgatado no mar por dois padres católicos que estão no Japão para uma missão jesuíta. Escravo encarregado de fazer a segurança dos religiosos, Diogo chama a atenção do Lorde Oda Nobunaga, um poderoso comandante militar que lutava pela unificação do Japão, e passa a servir o seu clã. Seis meses depois, Nobunaga decide invadir a província de Iga, lar da shinobi Fujibayashi Naoe. Durante o ataque, Naoe recebe de seu pai a missão de proteger uma caixa secreta, mas ela acaba falhando. Sobrevivendo ao ataque, sofrendo perdas e vendo a destruição de sua terra natal, a jovem alimenta um forte sentimento de vingança e inicia uma jornada para tentar recuperar a misteriosa caixa.
Durante sua jornada no Japão, enquanto se torna um guerreiro poderoso, Diogo assume uma nova identidade, passando a se identificar como Yasuke. Embora estejam lutando em lados opostos, Yasuke resolve se aliar à causa de Naoe ao perceber que ela utilizava uma lâmina oculta no pulso. Os motivos dessa escolha ficam mais claros na reta final do game, portanto não entrarei em maiores detalhes. A introdução dos Assassinos e Templários também acontece em uma fase avançada do enredo: mesmo fazendo uso da lâmina oculta, Naoe demora a descobrir a sua ligação com a Irmandade dos Assassinos. Isso significa que durante grande parte da narrativa acompanhamos a shinobi no seu propósito pessoal: lutar contra um grupo de samurais mascarados, identificados como Shinbakufu.
Em termos narrativos, os melhores momentos de Assassin’s Creed Shadows estão no começo e no final do jogo. A parte intermediária apresenta um desenvolvimento lento e em alguns casos se mostra até mesmo um pouco confusa; com exceção de um ou outro personagem, não há nada que realmente consiga se destacar. Por outro lado, o fato de Naoe e Yasuke entrar em contato com os mais variados tipos de pessoas nos permite conhecer as diversas facetas daquela sociedade. À medida que avançamos, vamos aos poucos conhecendo detalhes do passado dos dois protagonistas, sendo que no caso de Naoe há um conjunto de missões secundárias, chamadas de kuji-kiri, totalmente focado em explorar a história da personagem.
Com aproximadamente uma hora e meia de gameplay, o jogo começa a nos dar liberdade, permitindo a construção de instalações no esconderijo, que serve como base de operações para Naoe e seus aliados, e a escolha da ordem em que iremos concluir as missões. Ao selecionar um objetivo, recebemos três pistas de onde devemos ir. Para facilitar esse trabalho, podemos enviar batedores para investigar a área, e se o local estiver correto, o ícone será revelado no mapa. Nada nos impede de explorar a região e tentar descobrir por conta própria a localização, isso apenas torna o processo mais demorado. No começo achei a proposta interessante, mas conforme fui avançando senti que ela estava tornando a minha progressão lenta, já que houve ocasiões em que não haviam mais batedores disponíveis. Uma forma de fugir desse sistema é ativar no menu a exploração guiada, que revela de imediato o lugar exato em que precisamos ir.
Além da função de exploração, os batedores podem transportar para o esconderijo grandes quantidades de materiais que encontramos pelo mundo. Os batedores são recarregados automaticamente a cada troca de estação e podemos aumentar o seu número no esconderijo. É também na base de operações que melhoramos os equipamentos de ambos os protagonistas, por isso é sempre bom construir e aprimorar as instalações lá existentes. A coleta de recursos é essencial para evoluir o esconderijo, as armas e armaduras, portanto é sempre bom pegar tudo o que estiver pelo caminho.
Conforme acumulamos XP e subimos de nível, ganhamos pontos de maestria para melhorar as habilidades de Naoe e Yasuke. Cada personagem possui o seu próprio conjunto de árvores de habilidades, com foco em suas especialidades e armas, possibilitando que o jogador escolha evoluir aquilo que mais combina com o seu estilo de jogo. Para seguir progredindo nas árvores de habilidades, é preciso aumentar o nível de conhecimento, o que nos obriga a realizar atividades secundárias espalhadas pelo mapa, como encontrar páginas perdidas em templos, prestar homenagens em santuários, participar de desafios de arco e flecha a cavalo, dentre outros. São atividades que tendem a se tornar repetitivas, porém são recompensadoras.

Na maior parte do tempo, Assassin’s Creed Shadows permite que o usuário escolha com quem irá jogar. Os dois protagonistas apresentam propostas bem diferentes: Yasuke é resistente e preparado para encarar os confrontos, ao passo que Naoe apresenta uma variedade de recursos para abordagens furtivas. Graças a sua facilidade em realizar parkour e ao gancho que lhe permite escalar o telhado das construções, a exploração com a shinobi é bem mais satisfatória. Yasuke até consegue subir em cima de certas casas, mas o seu peso impede que ele ande sobre as cordas. Recursos já conhecidos, como facas arremessáveis, bombas de fumaça, sinos e visão de águia estão de volta. Dentre as novas opções estão a capacidade de se pendurar no teto, ficar deitado, assassinar alvos através das portas e utilizar um caule para respirar debaixo d’água. Apagar velas que iluminam o ambiente também é um recurso útil para evitar ser detectado. A mecânica de dois protagonistas é executada de uma forma muito satisfatória: mesmo que Naoe ofereça uma maior gama de possibilidades, em alguns casos entrar em combate com Yasuke pode ser mais efetivo, já que esse não é o ponto forte de sua parceira.
O combate é focado em quatro elementos básicos: atacar, aparar os ataques com indicador azul, desviar dos ataques com o indicador vermelho e contra-atacar. Durante a aventura nos deparamos com diferentes tipos de inimigos, alguns mais fáceis de derrotar e outros com um grau maior de habilidade, o que torna os confrontos dinâmicos, principalmente quando há uma maior quantidade de oponentes. Ambos os protagonistas podem ser equipados com dois tipos de armas, com as quais podemos executar ataques leves, pesados e especiais, este último desbloqueado nas árvores de habilidades. Outra possibilidade disponível é solicitar o apoio dos aliados, personagens que conhecemos durante o game e que se juntam a causa de Naoe.
No geral, gostei bastante da jogabilidade de Assassin’s Creed Shadows, seja nos momentos de ação ou nas abordagens furtivas. Há, porém, momentos em que o game deixa a desejar. No combate, a câmera muitas das vezes não nos oferece uma visão muito vantajosa, especialmente quando estamos sofrendo ataques provenientes de várias direções. Quando o confronto acontece em algum ambiente interno, a situação é ainda pior. Andar de cavalo em muitos momentos se mostrou algo inusitado, já que o animal apresenta comportamentos estranhos em diversas circunstâncias. Mesmo com a atualização de correção no dia do lançamento, ainda tive problemas com o cavalo.
Decidi jogar o título no modo desempenho, que prioriza a jogabilidade em uma taxa de quadros maior. Mesmo com uma menor fidelidade gráfica, Assassin’s Creed Shadows me impressionou com sua beleza e detalhes no ambiente, o que fica mais impressionante quando olhamos o tamanho do mapa. Jogadores que gostam de utilizar o modo foto certamente conseguirão fazer bons registros nas variadas paisagens do Japão. Além do clima dinâmico, o título também conta com a troca de estações do ano, transformando completamente os ambientes. No inverno podemos nos deslocar sobre lagos congelados e sentimos uma maior dificuldade ao andar em áreas com um grande acúmulo de neve, enquanto no verão há grama alta e arbustos volumosos, facilitando as ações furtivas. No outono os ventos sopram as folhas e na primavera o ambiente é transformado com as árvores floridas. Outro aspecto que me impressionou é o grau de destrutibilidade dos cenários, a Ubisoft realmente caprichou nesse ponto.
Em um mapa tão grande, era necessário haver locais para efetuar viagens rápidas. Em Shadows eles estão presentes de duas formas: nos pontos de observação e nos Kakurega. No caso dos pontos de observação, é necessário escalar até o topo para realizar a sincronização, ao passo que os Kakurega precisam ser adquiridos. Além de proporcionar as viagens rápidas, os Kakurega funcionam como pequenas bases onde podemos acessar o armazenamento, reabastecer suprimentos, revigorar batedores, gerenciar aliados e visualizar os contratos disponíveis.
O jogo também se destaca na parte do som, com uma ótima trilha sonora, sons ambientes e efeitos sonoros muito bem trabalhados e que aumentam a imersão. A dublagem brasileira no geral é bem executada, mas há nomes de personagens que são pronunciados de duas formas, algo que a direção de dublagem aparentemente não se atentou. Isso acabou me incomodando, principalmente quando essa diferença de pronúncia vinha em falas sucessivas.
Com relação a otimização, houve momentos em que notei quedas na taxa de quadros, mas nada que chegasse a comprometer a experiência. Durante as minhas mais de 55 horas de jogatina, o jogo travou e fechou sozinho uma única vez. Já na reta final da aventura, houve um bug que me obrigou a recarregar o último ponto de salvamento automático: fui parar dentro de uma rocha após realizar um ataque e de lá não consegui sair. Presenciei também alguns NPCs com comportamentos esquisitos, algo que não chega a ser uma novidade em títulos de mundo aberto.
Assassin’s Creed Shadows está disponível para PC, PlayStation 5 e Xbox Series. Esta análise foi feita com base na versão de Xbox Series X com uma cópia fornecida pela Ubisoft.

Considerações finais
Tendo se consolidado como uma empresa especializada em produzir jogos de mundo aberto, a Ubisoft atingiu seu ápice com Assassin’s Creed Shadows. Além da beleza dos ambientes, a forma com que eles se transformam com o passar das estações realmente impressiona, interferindo inclusive na jogabilidade. Ainda há uma certa repetição de alguns objetivos secundários, mas houve um melhor aproveitamento das atividades espalhadas pelo mapa.
Com uma dupla de protagonistas extremamente carismática, a história poderia ter um desenvolvimento mais envolvente na parte intermediária. A temática da Irmandade dos Assassinos e a Ordem dos Templários é introduzida em um ponto avançado da história e acaba ganhando pouco destaque, o que pode ser uma decepção para os fãs veteranos da franquia. Por outro lado, temos algumas tramas interessantes envolvendo os conflitos regionais japoneses, o que acaba compensando. Seja agindo furtivamente ou de forma agressiva, Assassin’s Creed Shadows oferece uma experiência equilibrada e divertida.